Apesar da máxima de que “o papel aceita tudo”, nem sempre é fácil transformar o pensamento em texto. Ainda mais quando escrevemos um roteiro pela primeira vez e não estamos familiarizadas com a escrita deste tipo de trabalho.
No caso de um produto audiovisual, um roteiro serve para guiar toda a equipe e contar a história geral para a criação de camadas que serão apresentadas por cada uma das profissionais envolvidas no filme. Se você deseja saber mais sobre o assunto, acesse a nossa seção Roteiro e leia alguns dos nossos artigos.
O que saber antes do meu primeiro roteiro?
A primeira dica pode soar a coisa mais óbvia do mundo, mas é, com certeza, o erro mais recorrente na hora de avaliar um roteiro de alguém que está começando a escrever: roteiro não é literatura.
Apesar de também contar histórias, a roteirista utiliza as palavras para explicar a ação e não para oferecer uma experiência de leitura.
Outra informação importante para quem está começando a escrever roteiros é nunca cercear a liberdade de criação das profissionais que também farão o filme junto com você.
Como as roteiristas costumam fazer isto?
Elas simplesmente dizem à atriz como atuar (agora, a personagem X mexe a boca), à diretora como dirigir (câmera de baixo para cima a fim de reforçar a relação de poder entre as personagens X e Z) ou à diretora de fotografia a como criar as luzes do filme (vamos precisar de muita luz no set).
Este é um erro tão comum e tão grosseiro que pode influir no produto final e nas suas próximas produções. Em seu roteiro, pontue apenas o que for pertinente. Deixe que o resto das escolhas a serem tomadas envolva as outras pessoas também.
O que é uma cena?
Uma cena é um conjunto de ações que se desenvolvem dentro de um mesmo espaço e tempo. Este arranjo funciona tanto para fins de produção quanto de storytelling, já que podemos desenhar os contornos da história em cada uma das cenas.
Como é a estrutura de um roteiro de cinema?
Você já escreveu o seu texto em uma folha corrida? Então experimente agora dividir o seu roteiro em quatro partes distintas: o cabeçalho, a ação, o diálogo e a transição.
Este modelo de organização do texto é chamado de Master Scenes e, por convenção, estima-se que cada página escrita dure um minuto. Assim, quinze folhas equivalem a um curta-metragem de quinze minutos e um longa-metragem é um documento de sessenta laudas ou mais.
Primeiro elemento: o cabeçalho
O primeiro elemento do texto é o cabeçalho, onde estão indicados o tempo e o espaço da cena. Podemos subdividir o cabeçalho em três partes: tipo de locação, localização e tempo.
Por tipo de locação, entende-se um local interno ou externo (se fora ou dentro de casa, por exemplo), por localização, o lugar onde a cena irá acontecer (se na rua, em casa ou no bar) e por tempo, às divisões do dia e da noite (madrugada, dia, tarde).
Sendo assim, um exemplo provável de cabeçalho seria:
INT. SALA DE JANTAR – NOITE
Segundo elemento: a ação
A ação, segunda parte da divisão aqui apresentada, é o núcleo central da narrativa e o motor do nosso roteiro. Ao escrever, lembre-se de sempre utilizar os verbos no tempo presente. Ex:
MARGÔ abre as cortinas. Um carro preto estaciona em seu jardim.
Em alguns roteiros, os ruídos e os objetos podem aparecer em caixa alta também, mas esta indicação só deve acontecer se eles forem vitais para a narrativa.
Terceiro elemento: o diálogo
O diálogo, uma das partes mais difíceis de um roteiro por conta da transposição da fala para a escrita, apresenta dois blocos de construção: a personagem e sua fala.
Damos o nome de parenthetical às emoções ou ações que acompanham estas falas. Observe esta estrutura:
MARGÔ
(irritada)
O que está acontecendo?
Quarto elemento: a transição
As transições são responsáveis por encadear a história. As mais comuns são:
Continua (CONT) – Marca que um diálogo continua, apesar da ação transcorrida entre as falas.
Mais (MAIS) – Usada para indicar que o diálogo foi interrompido por conta do fim da página. Precisaremos marcar (CONT) ao lado do nome da personagem, na próxima página.
Voz Over (V.O) – Indica a figura de um narrador. (você pode ler sobre este assunto, aqui)
Off Screen (O.S) – Utilizamos esta expressão para indicar que a personagem está falando, mas não aparece na tela naquele momento.
Como devo formatar o meu roteiro de cinema?
Ficou na dúvida de qual espaçamento usar, do tamanho da fonte e de como numerar as páginas do seu roteiro? Se você está começando a escrever um, sugiro que não se preocupe tanto com isto no momento. Parece um absurdo? Talvez.
Mas a verdade é que para um bom começo devemos nos ater à narrativa em vez de querer formatar o roteiro do modo mais profissional possível. Aconselho então que você instale alguns aplicativos e softwares para realizar este trabalho com você. Existe um muito bom para isto: o Celtx, gratuito e funcional. Quer maneira melhor de ir aprendendo do que fazer?
Como indicar as personagens em um roteiro de cinema?
Quando uma personagem aparece pela primeira vez, devemos colocar o nome dela em CAIXA ALTA e fazer uma breve descrição de sua aparência. Você não precisa caracterizar todas as pessoas do seu texto, apenas ressaltar os aspectos que fortalecem a sua dramaturgia e que são essenciais para a história acontecer do jeito que você imaginou. Ex: MARIA, mulher trans, alta e ruiva, entra na sala.
O que evitar no meu roteiro?
Fuja dos adjetivos, dos advérbios e das citações.
Você sabe o porquê?
No caso dos adjetivos, temos dois bons motivos para dispensá-los. O primeiro ponto é que um texto repleto de adjetivos costuma desviar a atenção da cena e da ação que ali se desenvolve. O segundo fator, de ordem prática, é que os adjetivos atribuem valor e podem ser uma dor de cabeça para a Direção de Arte do filme.
Veja só: se em seu roteiro, você pontua que na cena 4, existe um vaso de cerâmica chinesa amarela na sala, espera-se que você tenha criado algum artifício para justificar esta escolha. Caso contrário, imagine a tarefa desnecessária de procurar por uma peça que poderia ser facilmente reposta por outra e causar o mesmo efeito.
Os advérbios também estão na nossa lista de contraindicação por estarem ligados ao trabalho de encenação, algo que diz respeito ao trabalho das atrizes, montadoras e diretoras. Não compete, portanto, à roteirista determinar a duração de um plano ou de um movimento da cena. Deixe que estas situações se resolvam na hora de gravar o filme.
O uso de citações também é um problema comum. Uma frase proferida por alguma personagem precisa soar convincente e reforçar todo o constructo criado. O problema das citações mal colocadas é que elas fazem o seu texto perder a força e a autenticidade.
Finalmente, evite o negrito, o itálico, o sublinhado e o rasurado em seus roteiros. Eles não são bons marcadores para a cena e não condizem com a ideia de um roteiro bem estruturado.
Fonte das imagens: Freepik.
PERFEITO!